sábado, 13 de agosto de 2011

Coração de linho

Bem que me avisaram que não era bom dormir virada para o lado do coração. Agora sei como foi que o meu acabou se amarrotando todo. Pena que coração não se passa a ferro, nem a limpo. Há sempre que se carregar aquela incômoda sensação de que alguém, a qualquer momento, pode reparar. Tudo bem, se disserem alguma coisa, você pode improvisar e dizer que se amarrotou no caminho. Afinal, é difícil acreditar que o sujeito de óculos, sentado na mesa ao lado, tem coração tão esticado e engomado quanto o colarinho da camisa. Out of fashion, por sinal.  

O problema é que eu sempre tive mesmo essa leve inclinação à esquerda.  Afinal, este é o lado da bossa, dos inquietos, dos que colocam a boca no mundo. Dizem que é o lado mais criativo do cérebro e é também a mão que se dá ao compromisso.  Para os islamitas, é onde mora o anjo que anota todos os seus mal feitos. Para os cristãos, é o outro lado da face que, caso te agridam, você deve entregar. Já no futebol, é a lateral mais comentada, onde atua a defesa. E para quem não tem mais o que fazer, é a orelha que queima quando falam mal de você.

 De um jeito ou de outro, este é o lado que mais me atormenta e seduz. Onde convivem amor e dor. Onde aflora toda a minha sensibilidade. Onde me entrego, e me encontro. Só queria me lembrar de dormir mais a direita, para proteger o coração ou simplesmente, permitir que o tempo o faça desamarrotar. Na próxima encarnação quero nascer com coração de poliéster ou náilon. E se possível, canhota.

Um comentário:

  1. me lembrei do samba do grande amor, do chico:
    "Hoje eu tenho apenas
    Uma pedra no meu peito
    Exijo respeito
    Não sou mais um sonhador
    Chego a mudar de calçada
    Quando aparece uma flor
    E dou risada do grande amor
    Mentira"

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